terça-feira, 26 de dezembro de 2017

Os barqueiros da madrugada


A expressão barqueiros até hoje tem autoria desconhecida em Belém. Serve para denominar pejorativamente os jogadores boêmios, nem sempre craques e muito menos pernas-de-pau, Basta apenas que gostem da noite. E, claro, principalmente da bebedeira.

Eduardo Ramos. no presente. é o caso mais emblemático dessa galera que tanto gosta do gramado como das loiras geladas. Os que criticavam seu comportamento extra-campo até o apelidavam de Eduardo Brahma... Hoje, porém, todos se consideram fotógrafos e repórteres da vida alheia. E por isso mesmo as fotos do jogador eram postadas através dos selfies aos montes na internet curtindo as noitadas alegres belenenses. Embora ele não estivesse “nem ai” tanto para os genéricos de paparazzi quanto para os fofoqueiros de plantão. Quando jogava bem era aclamado como “o maestro” do time remista. Ao contrário, lembravam logo do seu lado boêmio como entrave ao seu melhor futebol em campo. E ele foi se deixando levar pela vida enquanto esteve no Baenão. Neste final de ano, porém, a quase unanimidade da galera azulina o queria ver bem longe daqui. E por isso o Remo não renovou mais seu contrato.

No passado, o maior ídolo do futebol azulino, Alcino, por vezes chegava de manhãzinha, trancava-se em seu apartamento no estádio “Evandro Almeida” e só saia quase direto para o campo. Não sem antes ouvir poucas e boas do presidente (desde aquele tempo tão remoto , já era o cartola-mór do clube azulino...) Manoel Ribeiro. A única pessoa a quem respeitava, inclusos os vários técnicos que passaram pelo Baenão em sua época. Mas respondia por sua vida desregrada com muitos gols em campo. E por isso mesmo a torcida o idolatrava. Era farrista? Problema dele. Sabia fazer gols? Problema também dele que procurava como resolve-los: marcando gols.

Contam que o atacante Balão era uma “moça” em Belém. Mas quando o Remo ganhava um campeonato ou qualquer outra partida importante, ele costumava se enfurnar em São Francisco do Pará, sua terra natal e “entornava” todas em companhia dos amigos de adolescência. Tudo bancado por ele. Lembrava Garrincha e sua turma de Pau Grande. a cidadezinha onde nasceu no interior do Rio de Janeiro. Balão às vezes só retornava quando o presidente Raimundo Ribeiro mandava busca-lo. Ou “coercitivamente” regressava a Belém.

O saudoso zagueiro Gilvandro fazia tanto sucesso com a bebida e mais ainda com as mulheres, de vida fácil ou não, nos recuados anos 1950. Era bonitão e jogava com vigor. O apelidado “Bacalhau” pela galera bicolor, em campo, entretanto, suava mesmo a camisa do Papão. Era tido como um dos ídolos daquela década em que o PSC quebrou o encanto de títulos estaduais depois de quase um decênio de jejum.

Neves e Zequinha, atacantes do Remo, formavam uma dupla insuperável em farras. Ambos já falecidos. O técnico Zizinho, porém, acabou com o estrelismo de Nevasca, mandou que o Remo o emprestasse a algum clube. Em seu time, não o queria mais. Ele passou uma temporada do Fortaleza e quando Mestre Ziza - que diziam gostar da “pinga” (cachaça) quando era um cracaço em seu longo tempo de jogador - era intransigente com jogador farrista. Lembrava aquele surrado, porém, sempre evocado provérbio: “faz o que eu digo, mas não o que eu faço”. Sem tanta demora, após Zizinho deixar o clube, Neves estava de retorno ao Leão.

A Tuna já teve quase um time inteiro onde só quem não gostava de beber, talvez fosse o massagista. Sem tanta garantia assim.

Comandados pelo zagueiro e capitão do time, Prata, a começar do excelente goleiro Délcio e arrastando com ele, Mário, Nascimento, Da Silva (um meia- armador próximo ao quilate técnico de Quarenta) e Santiago. De dia treinavam no Souza e à noite batiam ponto na Condor – naquele tempo, o famoso point boêmio de Belém. Misturados aos farristas , ninguém procurava se esconder. Pra quê? Eram boêmios assumidos. E todos bons de bola. Délcio e Prata foram emprestados ao Sport. O goleirão chegou a ser cogitado para integrar a Seleção Brasileira, tamanha sua performance no rubro negro pernambucano. Não deu para esperar. Com pouco tempo no Recife foi esfaqueado na porta de uma boate onde estava em companhia de Prata. Voltaram a Belém e ainda jogariam mais alguns anos. Délcio inclusive sendo emprestado ao Paissandu.

Os barqueiros em sua maioria encurtam a carreira, mas quando jogam, costumam prolongar as noitadas. Faz parte do show.

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