sexta-feira, 26 de outubro de 2018

Os bons repórteres de campo

Os primitivos BTPs 


No início do futebol pelo rádio, os que desejavam entrevistar jogadores e árbitros ou até mesmo contar com mais detalhes os fatos acontecidos no gramado, o trabalho era quase um parto. 

Os microfones eram esticados por fios “quilométricos” instalados sabe-se lá em que plugues, com um auxiliar ajudando o repórter nessa mini- maratona, Até chegar ao seu objetivo, no caso, o entrevistado. Do mesmo modo no pós jogo. Era literalmente uma “mão de obra” dos diabos desempenhar essa função em uma transmissão esportiva. 

A partir dos anos 1950 são fabricados aparelhos conjuntos englobando a caixa de som ao microfone e o indefectível fone de ouvido. O repórter carregava o transmissor ao tiracolo e o microfone na mão. A dificuldade maior, porém, era quando necessário, sair correndo com aquele trambolho pendurado no ombro. Uns eram mais pesados do que outros. Dependia do fabricante. Já em fins da mesma década começam a ser usados os microfones sem fio que passaram a ser chamados de BTP – Batments et travaux publics - (em tradução literal em francês, sem nenhum sentido ao do rádio). Uma espécie de caixa metálica ou de ferro, de formato comprido como se fosse um tijolo, mas não tão robusto e dotado de uma pequena antena na ponta, de fácil condução e manejo por parte de quem o utilizasse. Predominavam nas reportagens de rua e nos campos de futebol. Mais nestes do que naquelas. 

O primeiro BTP usado nos gramados de Belém teria sido fabricação própria através do técnico de som conhecido como Mucuim e que era o chefe do setor da Rádio Clube. Embora não fosse engenheiro especializado, era inventivo demais na matéria. A Marajoara e a Guajará –quando estreou no futebol em 1962 – já usavam modelos mais modernos. Contudo, dizia-se que o BTP primitivo da Clube era o de melhor som e audição. Mas a Marajoara chegou também a ter um do mesmo modelo da Clube. A Liberal quando estreou sua equipe em 1970 já usava um modelo muito mais moderno e portátil. Embora bastante eficiente.

ELES FORAM BONS REPÓRTERES 


Para prestar homenagem a alguns desses chamados repórteres-volantes, todos já falecidos, não poderiam ser esquecidos os nomes de Abílio Couceiro –que era um autêntico multifunções na emissora “Associada” - da Marajoara e João Álvaro, da Clube. Se equivaliam até na voz, de timbre fraco. 

Mas eram bons entrevistadores. Ainda que concorrentes quando só as duas emissoras transmitiam o futebol, a disputa pela primazia da entrevista respeitava sempre a ética. Além de também serem bons redatores para os jornais impressos. Abílio pela extinta A Vanguarda, vespertino dos “Associados” e João Álvaro, no Jornal do Dia, O Liberal e colunista na revista GOL. Todas essas publicações já extintas. 

Com estilos singulares, embora perseguindo sempre a notícia ou a entrevista em primeira mão, podem ser citados: Paulo Ferrer, que era até hilário com as informações minuciosas sobre os seus “prognósticos” de arrecadações e público presente aos estádios, chegando às “frações”, tanto em um como em outro quesito. Não era chegado a arredondar nem no número de torcedores e muito menos na renda. Suas conjecturas eram “meticulosas” Ainda que no real, quase sempre dispares...Foi o melhor repórter de rua, o que lhe valeu a consagração no “Amarelinho da Marajoara” a unidade volante da emissora. Começou na Liberal, alcançou sua maior projeção na Marajoara e teve passagens pela Clube e Cultura. Era goiano de Catalão. 

Nonato Santos apelidado de “Trovão” pela voz possante, mas de tonalidade agradável, era um tanto afoito. Linha de frente em busca dos fatos e de seus entrevistados, não tremia nas bases quando escalado para missões as mais difíceis. Certa feita foi enviada como repórter da Clube para cobrir a concentração da Seleção Brasileira nas Paineiras. Enfrentou as cobras da reportagem esportiva nacional. Estava, entretanto, sempre em cima do lance nas informações. 

E, por fim, depois de chefiar o Plantão da Clube na função de “escuta” por alguns anos, contratado pela Liberal quando a emissora montou uma equipe qualificada em 1970, Bellard Pereira se revelaria um bom repórter de campo. Bem articulado, sabendo formular perguntas objetivas, chegou a provocar um “quiproquó” com o truculento Paulo Amaral quando ele foi treinador do Remo pela primeira vez (1974). O entrevero se estendeu do gramado até a cabine da rádio no Baenão. Com repórter procurando minimizar a situação. Mas Paulo Amaral naquele seu estilo machão, tentava intimidar o repórter. Deu zebra. O chefe da equipe e um dos donos da emissora, o consagrado Edyr Proença, chegou na “hora do aperto”. E imediatamente expulsou o valentão treinador da cabine. Isso tudo com a solidariedade dos dirigentes do Remo presentes à tribuna de honra do estádio. Edyr era considerado um ícone não só da imprensa esportiva, mas sobretudo do Leão, clube do qual era considerado um de seus mais respeitados admiradores. Ainda que no exercício da profissão tanto no rádio como no jornal, soubesse conter seu amor pelas cores azulinas. Para ele, a ética sobrepunha sempre a paixão.

Legendas

1- O equipamento que Grimoaldo Soares empunha, é dos primórdios dos microfones volantes (meados dos anos 1950);

2- Luiz Brandão, narrador carioca da Marajoara, mostra o novo microfone volante da sua equipe (anos 1960);

3- João Álvaro em entrevista no estúdio da Rádio Clube (anos 1960);

4- Abilio Couceira entrevista o jogador do Remo, Jorge de Castro (anos 1960);

5- Bellard Pereira com o BTP primitivo da Clube – 1974;

6- Paulo Ferrer era hilariante, mas bastante ativo – 1975;

7- Nonato Santos bem equipado pela Clube nos anos 1980;

8- Antônio Tavares com um dos BTPs “tijolaços” pela Marajoara em 1975;

9- Carlos Estácio com um BTP mais confortável no final dos anos 1960;

10- Zaire Filho com o mesmo tipo de BTP em meados dos anos 1970;

11- Guarany Júnior usa um microfone portátil dos mais modernos pela Liberal -1975.

Um comentário:

  1. Boa noite!
    Quanto a definição do nome do equipamento com o acrônimo BTP, um amigo me explicou, o nome completo era BTP-R, justamente Batments et travaux publics radio ou também Batteries et travaux radio, ou seja Rádio a bateria para intervenções públicas, ou seja, para rádio portátil para uso fora do estúdio. A abreviação ternária, comum na cultura francesa, fez que o R ficasse de fora da abreviação.

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